quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Mudanças climáticas levarão a uma menor formação de nuvens?

Novo estudo se concentra na relação misteriosa entre nuvens e clima e descobre que um planeta mais quente pode resultar em menos nuvens
por Katherine Harmon
NASA
Céu limpo pela frente? Pesquisadores ainda investigam qual a função das nuvens na mudança climática
Não é tão fácil encontrar vestígios passados de nuvens quanto de dióxido de carbono. Mas, assim como o CO2, as nuvens desempenham um papel importante na mudança climática: podem tanto reter calor na atmosfera, aumentado o efeito estufa, quanto refletir a luz solar de volta para o espaço, resfriando o planeta.

Então, as nuvens contribuirão para a mudança climática ou ajudarão a atenuá-la? “Neste momento, não entendemos qual é essa relação,” explica Anthony Del Genio, cientista atmosférico da Nasa, que trabalha no Instituto Goddard de Estudos Espaciais, na cidade de Nova York.

Mas um novo estudo, publicado na revista Science, dá mais um passo adiante para a compreensão dessa complicada dinâmica, que será vital para se entender detalhadamente como nosso planeta será daqui décadas e séculos.

Quando se trata de prever as mudanças climáticas, nem todas as nuvens são formadas igualmente, ressalta a principal autora da pesquisa, Amy Clement, da Escola Rosentiel de Ciência Marinha e Atmosférica, da University of Miami. Segundo a cientista, as nuvens mais altas, como as cumulonimbus, produzem um efeito estufa (gerando umidade e re-emitindo radiação para a superfície), ao passo que as mais baixas agem de forma semelhante a um guarda-chuva, protegendo a Terra dos quentes raios solares.

Clement e sua equipe examinaram as nuvens estratiformes de baixa altitude sobre o nordeste do Oceano Pacífico. Pela comparação de conjuntos independentes de dados observacionais, acumulados durante os últimos 50 anos por navegantes e satélites, eles esperam entender como os relatos de cobertura de nuvens se relacionam com a temperatura e circulação do vento – e vice-versa. Para a surpresa desses pesquisadores, as observações marinhas e espaciais eram incrivelmente semelhantes, o que contribuiu para o crédito dessas fontes de dados, tachadas por muitos como não confiáveis.

A equipe sistematizou um modelo de clima (no Centro Hadley de Mudanças Climáticas, localizado no Reino Unido) que complementou muito bem seus dados. Esse modelo mostrou que o aquecimento das temperaturas da superfície e a diminuição da circulação de ar – tendências que devem ser mantidas num clima em mudanças – levam a uma menor quantidade de nuvens de baixas altitudes. E isto quer dizer temperaturas ainda mais altas na superfície terrestre.

Mas há ainda muito mais trabalho ainda a ser feito. “Acho que é um fragmento muito impressionante de análise observacional”, afirma Del Genio, que não integrou o estudo. “É a primeira vez que se demonstram essas mudanças através das décadas.” No entanto, complementa, o único modo de sustentar essas conclusões experimentais é a identificação de mais modelos.

É difícil estabelecer um modelo para as nuvens de baixa altitude, admite Clement. “São formadas em uma escala microfísica.” Segundo a pesquisadora, o modelo do Hadley provavelmente foi o mais bem-sucedido, pois continha o maior número de informações sobre os complexos processos ocorridos na atmosfera inferior, onde há contato com a superfície terrestre (uma região, explica Clement, para a qual é muito mais difícil de se construir um modelo do que para a circulação em larga escala presente na atmosfera superior).

E, como sempre, há a questão de como relacionar os eventos climáticos cotidianos às tendências climáticas a longo prazo. Como Clement ressaltou, “ao observar hora a hora os processos que acontecem nas nuvens, obtém-se um quadro muito complexo”. Porém, “os dados, ao serem analisados em uma escala de tempo de décadas, parecem resultar neste quadro muito simples: quando a superfície oceânica está quente e a circulação, pouca, a cobertura de nuvens é reduzida”.

O etanol do milho é prejudicial ao clima?

O governo Obama diz não, a Califórnia diz sim. Quem está com a razão?
por Douglas Fischer*
ISTOCKPHOTO/SVENGINE
Obama deu sinal verde para o etanol de milho, apesar das preocupações da Califórnia
O governo Obama recentemente deu sinal verde para o etanol de milho como combustível renovável de baixo teor de carbono. A decisão é uma aparente contradição à declaração da Califórnia, no verão passado, de que a pegada de carbono do biocombustível é grande demais para mitigar a emissão de gases de efeito estufa do estado.

Reguladores e peritos em políticas insistem na inexistência de um conflito: as duas regras obedecem à ciência; é simplesmente uma questão de em que ano se começa a contabilizar as emissões.

De fato, o timing é tudo. A Califórnia verificou suas atuais emissões associadas ao etanol de milho e concluiu que eram demasiado elevadas.

A Casa Branca, visando triplicar a produção anual para 163,29 bilhões de litros por ano em 12 anos, baseou sua decisão em projeções para o ano 2022. O governo presumiu que uma produtividade maior, mais eficiência de produção e novas descobertas mitigariam as emissões.

“Não existe conflito”, declarou Stanley Young, um porta-voz do California Air Resources Board (CARB), o órgão californiano que executa a primeira iniciativa nacional contra o aquecimento global. “Utilizamos metodologias diferentes”, alegou. “Além disso, indicamos que há vários caminhos para produzir etanol de milho com volumes de carbono que se encaixam em nossos padrões”, acrescentou. “Nem todos os etanóis são criados iguais”.

A decisão suscitou algumas dúvidas – e ceticismo – entre os peritos, que questionam se o governo não teria aproveitado uma folga política, propiciada pelas projeções futuras, para chegar a uma conclusão politicamente expediente.

“À primeira vista, isso parece um tanto duvidoso”, diz Nathanael Greene, diretor da política de energia renovável do Natural Resources Defense Council (NRDC). “Você pode até acreditar nisso, mas de todo modo, eles fazem muitas projeções sobre como será a produtividade, como estará o mercado”.

“O resultado é que as coisas parecem bem mais positivas naquele ano (2022) que a Califórnia calcula”.

Para atender ao padrão renovável do país, o “ciclo de vida” de emissões de carbono de um combustível deve estar pelo menos 20% abaixo do da gasolina. Calcular esses custos é complicado. As lavouras de plantas que geram combustíveis tendem a substituir as que produzem alimentos, e isso origina novas emissões à medida que os fazendeiros derrubam florestas e cultivam terras previamente intocadas para atender à demanda de alimentos.

Essas emissões podem ser consideráveis. Um artigo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences concluiu que o Brasil corre o risco de contrair uma dívida de carbono de 250 anos, com base no desmatamento esperado até 2010, à medida que o país expande sua produção de álcool de cana-de-açúcar e biodiesel de soja.

Os pesquisadores estão céticos quanto às alegações federais de que os avanços do etanol serão suficientes para compensar as emissões associadas ao desalojamento de lavouras de alimentos.

“Isso não é consistente com o que tenho lido em publicações revisadas por iguais”, declarou David Tilman, um professor de Ecologia da University of Minnesota, que estudou o conflito entre os biocombustíveis e as lavouras de alimentos.

“Você pode fazer projeções muito otimistas sobre produtividades futuras, mas se verificar as tendências passadas verá que até durante a Revolução Verde os aumentos foram insuficientes para atender às demandas que teremos no futuro”.

Evidências recentes, vindas do Brasil, sustentam esse ponto. Uma equipe de pesquisadores, chefiada por David Lapola, da Universidade de Kassel, na Alemanha, constatou que 90% da expansão brasileira de cana-de-açúcar, nos últimos cinco anos, desalojaram terras de pastagens, forçando os criadores de gado a avançar floresta adentro. O grupo de Lapola concluiu que o plano do Brasil, de ampliar suas lavouras destinadas a biocombustíveis na próxima década, forçará as áreas de pasto a penetrar em mais de 121.730 km2 de florestas e outros 45.998 km2 de habitats indígenas.

Isso equivale a uma área igual a dos estados de Nova York e New Jersey combinados.

“Parece que no caso do etanol de milho americano, haverá muito atrito (inclusive a utilização indireta de terras) com as lavouras de produtos alimentares, não só nos Estados Unidos, como no exterior”, Lapola informou via e-mail, da Alemanha.

O governo Obama insiste em ter utilizado a ciência mais recente e precisa. Ao falar à imprensa, quando a mudança foi anunciada, o Secretário da Agricultura Tom Vilsack frisou que a ciência da produtividade de lavouras “está evoluindo constantemente”.

A administradora da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) Lisa Jackson defendeu os cientistas de seu órgão governamental em meio a acusações de que a instituição cedeu a pressões do lobby agrícola. “Não concordo que tenhamos mudado a ciência para adaptá-la a qualquer resultado”, declarou ela. “Eu não assinaria uma norma se não acreditasse que tivéssemos atendido às exigências da lei”.

Mas, sob certos aspectos, a economia de carbono derivada do etanol de milho pode ser um ponto secundário – ou até mesmo questionável.

Ao anunciar a mudança de política, o governo ressaltou o potencial do biocombustível para criar empregos e proporcionar independência energética. Falando a governadores, o presidente Obama mencionou a mudança climática apenas uma vez: “mesmo que não acreditem na severidade da mudança do clima, como eu, ainda assim vocês deveriam seguir esta agenda”.

Além disso, o governo – e muitos na indústria do etanol – encaram o combustível à base de milho como uma ponte para biocombustíveis menos intensivos em carbono. “Acreditamos que este é o rumo do mercado”, disse Vilsack.

Mas a pressão para desenvolver etanol de milho tem um preço e Greene, do NRDC, questiona se essa é a política mais sábia. “É tolice fazer o que estamos fazendo hoje, que é mandar, conceder múltiplos créditos de impostos e outros subsídios governamentais”, ponderou ele. “Estamos subornando o mercado... Isso são US$ 5 bilhões por ano que poderíamos utilizar para ajudar nossos fazendeiros e nossa indústria a desenvolver a próxima geração desse material”.

Referindo-se ao Brasil, Lapola observou que alguns biocombustíveis não têm a enorme pegada de carbono, deixada pela cana-de-açúcar, a soja ou o milho. Mas enquanto os governos mantiverem um rigoroso controle sobre mudanças no uso de terras, ele acredita que os biocombustíveis constituem uma boa opção para contornar a necessidade de combustíveis derivados do petróleo.

“Uma forma de contornar, mas não uma solução completa”, acrescentou. “O fato é que, a partir de agora, precisamos avaliar mais cuidadosamente nossa matriz energética para não incorrer nos mesmos erros que cometemos com o petróleo”.


*Esse artigo foi publicado originalmente em The Daily Climate, a fonte de notícias sobre mudanças climáticas da empresa de mídia sem fins lucrativos, Environmental Health Sciences.

Fósseis revelam dinossauros aquáticos

Os hábitos semiaquáticos dos espinossauros os ajudaram a coexistir com os tiranossauros
por Matt Kaplan
Marc Simonetti
Espinossauros podem ter passado muito tempo das suas vidas na água
Alguns pesquisadores encontraram evidências de dinossauros que passavam muito tempo na água. Essa descoberta, feita ao se analisarem isótopos de oxigênio encontrados nos fósseis de um espinossauro que se alimentava de peixes, demonstra como o dinossauro deve ter coexistido com outros grandes predadores, como os tiranossauros.
Os resultados, publicados na revista Geology, por Romain Amiot, da Universidade de Lyon na França, e uma equipe de colegas, demonstram que os dinossauros não estavam, na verdade, restritos à terra como se pensava anteriormente.

Animais aquáticos, como os plesiossauros e os ictiossauros, que, embora pareçam com dinossauros, não fazem parte da linhagem dos dinos.
Baryonyx walkeri, da família dos espinossauros, possui um crânio longo e parecido com o de um crocodilo, cheio dos característicos dentes em formato de cone. Quando ele foi encontrado, as teorias eram que, com esses dentes perfurantes, em vez dos dentes serrados normalmente encontrados em carnívoros aparentados, como o Tyrannosaurus rex, e um focinho grande, esse dinossauro se alimentasse de peixes.

Evidências de um comportamento piscívoro vieram com a descoberta de escamas de peixe parcialmente digeridas no estômago fossilizado dentro de um esqueleto de Baryonyx escavado na Inglaterra em 1983. Mas os conteúdos estomacais também continham restos de dinossauros, e outras evidências posteriores demonstram que os pterossauros também eram parte da dieta dos espinossauros, tornando a questão mais complicada. A ausência de barbatanas, membranas entre os dedos das patas ou caudas propulsoras perceptíveis também não sugeriam um modo de vida aquático.

Isso levou Amiot e seus colegas a procurarem isótopos de oxigênio presos dentro do esmalte dos dentes do espinossauro e compará-los com os isótopos de oxigênio encontrados nos dentes dos crocodilos e outros dinossauros e em fragmentos de cascos de tartarugas do mesmo período.
Animais que passam muito tempo em um ambiente seco perdem água na respiração e na evaporação pela pele. Pelo fato de o oxigênio-16 ser mais leve do que outro isótopo – o oxigênio-18 –, ele é liberado de forma mais frequente com o vapor d\\'água. Em consequência, o oxigênio-18 se torna mais concentrado nos tecidos e no momento da formação do esmalte dos dentes.

Estando submersos grande parte do tempo, animais aquáticos perdem menos água do que os terrestres, e, portanto, o oxigênio-18 possui uma concentração relativamente menor nos seus tecidos. Animais aquáticos também bebem e urinam mais rapidamente que os animais terrestres; essa lavagem constante com água doce mantém as concentrações de oxigênio-18 baixas.

Os pesquisadores raciocinaram que, se os espinossauros fossem aquáticos, a concentração de oxigênio-18 nos seus tecidos iria ser bastante parecida com a de animais aquáticos como os crocodilos e as tartarugas, e seria bem menor que os valores dos isótopos de outros animais.

Para ver se esse era o caso, a equipe coletou dados de isótopos de 133 espécimes do Cretáceo – mistura de espinossauros, outros dinossauros, crocodilos e tartarugas – em quatro continentes diferentes. Eles relataram que os espinossauros apresentaram valores de oxigênio-18 1,3% menores que os encontrados em dinossauros terrestres – uma diferença estatisticamente significativa. Ao contrário, os valores de oxigênio-18 em crocodilos e espinossaurídeos não diferiram de forma significativa. A equipe argumentou que isso indica que os espinossauros viviam em ambientes aquáticos.

“Essa é uma ilustração intrigante de como as análises cuidadosas do isótopo podem ser utilizadas para diferenciar os ambientes nos quais os dinossauros e outros organismos viviam”, afirma o paleontologista Michael Benton, da University of Bristol, no Reino Unido.
Uma objeção em potencial contra as novas descobertas é que uma dieta composta, principalmente, de animais aquáticos como peixes, levaria à ingestão de comida inerentemente pobre em oxigênio-18 e faria com que os tecidos do espinossauro adquirissem valores de oxigênio-18 baixos.
No entanto, Amiot argumenta que “mesmo se os espinossauros comessem somente peixes e fossem animais terrestres, eles evaporariam a água desses peixes ingeridos pela pele e pela respiração e terminariam com uma assinatura isotópica terrestre”.

“O método que eles estão usando é sutil e controverso, mas, com o resultado repetido em numerosos espécimes de espinossauros de tantas localidades diferentes, ele pode muito bem estar certo”, afirma Benton.
No entanto, para alguns, é o visual não aquático do esqueleto do dinossauro que é difícil de ignorar. “Eu não duvido dos dados de isótopos, mas se eles viviam na água, eu fico perplexo pelos espinossauros não terem membros modificados para propulsão aquática, ou caudas flexíveis e propulsoras observadas tipicamente em animais aquáticos”, questiona Paul Barret, um paleontologista do Natural History Museum em Londres.

Amiot não consegue responder essa pergunta ainda, mas ele está disposto a começar a investigar o momento no qual os espinossauros começaram as suas vidas aquáticas, e espera que uma compreensão de quais forças os levaram para a água possa explicar de forma mais acertada os mistérios que ainda Os hábitos semiaquáticos dos espinossauros os ajudaram a coexistir com os tiranossauros permanecem sobre o grupo.

Scientific American Brasil