quinta-feira, 5 de abril de 2012

O que são fractais?

Fernanda Salla
São figuras geométricas muito loucas, produzidas por meio de equações matemáticas que podem ser interpretadas como formas e cores por programas de computador. Sua principal característica é a autossimilaridade. "Eles contêm, dentro de si, cópias menores deles mesmos. Essas cópias, por sua vez, contêm cópias ainda menores e assim sucessivamente", explica Eduardo Colli, professor do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP). Os fractais estão ligados a áreas da física e da matemática chamadas Sistemas Dinâmicos e Teoria do Caos, porque suas equações são usadas para descrever fenômenos que, apesar de parecerem aleatórios, obedecem a certas regras - como o fluxo dos rios. Eles não são explicados pela geometria euclidiana (aquela que você aprende na escola), pois possuem dimensão fracionária. "Essa fração está relacionada com a quantidade e a escala de ampliação das cópias da figura contidas dentro dela mesma", diz Colli. Outra característica é que possuem complexidade infinita: um zoom em um detalhe da imagem revela novos detalhes.

• Mergulhe num fractal do Conjunto de Mandelbrot no vídeo abr.io/mandelbrot

• Construa seu próprio fractal! Basta digitar qualquer número no formulário do link abr.io/fractal e ver o resultado

EXEMPLO CLÁSSICO Graficamente, um bom exemplo de fractal é o da Curva de Koch, que remete a um floco de neve. O procedimento para criá-lo é simples e repetitivo: adicionar triângulos ao perímetro de um triângulo inicial

Uma questão matemática
Destrinchamos uma das equações clássicas de fractais

Resolva essa!

Há diversos tipos de equações capazes de gerar essas figuras. Um dos conjuntos de fractais mais conhecidos é o do matemático polonês Benoît Mandelbrot, que ajudou a popularizá-los a partir de 1975. Embora exija um nível avançado de conhecimento matemático, esta equação é razoavelmente simples se comparada com outras. Veja:

A origem

É um número complexo, que representa o ponto inicial da figura. É descoberto por outra equação, que soma uma parte real e outra imaginária

O progresso

Aplicando e desenvolvendo repetidamente esta função, chamada de iteração, é possível descobrir "para onde o ponto vai"

A direção

É um ponto estabelecido dentro do plano complexo. É formado pela soma de dois outros números, às vezes citados como "coordenadas" em uma imagem de fractal

A teoria na prática Onde os pesquisadores têm encontrado fractais

Medicina

A estrutura do pulmão e as ramificações dos neurônios remetem a essas figuras. Entre outros benefícios, a compreensão do desenvolvimento dos fractais pode ajudar a prever a evolução de doenças como o câncer, facilitando diagnósticos precoces

Arte

O inglês Phil Jackson lançou, em 1998, o álbum Organized Chaos, que transformava cálculos matemáticos em música fractal. E figuras psicodélicas como as desta matéria já viraram exposição, até no Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo

Computação gráfica

Alguns tipos têm sido utilizados como base de animações digitais. Eles ajudam a criar texturas, simular vegetação ou construir paisagens complexas. Apollo 13 (1995) e Titanic (1997) são alguns filmes que aplicaram esse recurso

Geografia

Os dobramentos das camadas de rocha que formam o solo são criados por dobramentos ainda menores, como um fractal. Ao se definir, por computador, esses padrões, pode-se estudar a instabilidade dos solos e prevenir catástrofes como a da região serrana do Rio de Janeiro

Economia

O conceito de fractal é usado no entendimento do comportamento da Bolsa de Valores. A variação do valor da ação em um dia de pregão é similar à variação de uma semana, um mês, um ano ou uma década. Com isso, é possível fazer estatísticas mais precisas

Fontes Eduardo Colli, professor do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP); Fábio Kon, professor do departamento de Ciência da Computação do IME-USP; Nilson Jorge Baldovinotti, membro do Grupo de Pesquisa em Processos de Formação e Trabalho Docente de Professores de Matemática da Unesp de Rio Claro (SP); The Fractal Geometry of Nature, de Benoit B. Mandelbrot; site da Universidade de Yale; site FractalArts.com
Revista Mundo Estranho

É possível correr sobre a água?


Bruno Lazaretti

Para o ser humano, não! Para realizar a proeza, seria preciso dar 125 passos por segundo - 50 vezes mais que um velocista. Além disso, os pés teriam que atingir a água a velocidades sobre-humanas, empurrando a água para baixo com força suficiente para não afundar. Recentemente, a façanha foi "documentada" em uma campanha viral que rodou a internet. O vídeo mostrava esportistas correndo sobre as águas, supostamente graças a um tênis à prova d'água. O programa Pânico na TV copiou a brincadeira. Nos dois casos, o truque era correr sobre plataformas escondidas pouco abaixo do nível da água.

LAGARTO JESUS*
Lagartos do gênero Basiliscus andam sobre a água por pequenos trechos dando 20 passos por segundo. Eles são leves e membranas nas patas formam bolhas de ar que os ajudam a flutuar

CONSULTORIA - Cláudio Furukawa, do Instituto de Física da USP

*Jesus Christ Lizard, em inglês

Correndo no molhado

Velocidade para andar na água seria menor que a de um velocista, mas até Usain Bolt naufragaria tentando

TAMANHO DA LANCHANa hora de (tentar) correr sobre a água, o peso do corpo e a área de contato com a superfície são importantes. Para fazer os cálculos, imaginamos um corredor com 75 kg e um calçado de 30 cm de comprimento por 12 de largura - tamanho 43. Isso dá uma área de contato de 360 cm2 a cada pisão

VELOCIDADE MÁXIMA

Sapateando a esse ritmo, o corredor se manteria sobre a água no mesmo ponto. Para ir em frente, ele teria que atingir a água num ângulo de 4 graus. Assim, ele andaria uns 3,5 cm para a frente a cada passo. Dando 125 passos por segundo, a velocidade média seria de aproximadamente 16 km/h

PASSADA LIGEIRA

A pisada não pode ser muito profunda, porque o atrito tornaria difícil tirar o pé da água. Afundando só 5 cm, o pezão empurraria 1,8 litro de água para baixo. Então, para multiplicar essa força de reação e se sustentar sobre a água, a velocidade do pé ao atingir a superfície teria de ser 46,8 km/h

ALTA FREQUÊNCIA

Cada pisada a uma velocidade dessas e afundando só 5 cm duraria 8 milésimos de segundo. Ao fim de cada passo, outro de igual velocidade teria que ser dado. Isso significa que o corredor teria que dar cerca de 125 passadas por segundo (um corredor de 100 m rasos dá apenas cinco passos nesse tempo)
Revista Mundo Estranho

Entenda a criação da célula sintética

A bactéria controlada por um genoma artificial é o primeiro passo para a criação de formas de vida artificiais. Veja infográfico

Natasha Madov
Foto: Divulgação
Colônia de bactérias M. mycoides vista por microscópio eletrônico: vida a partir da vida

“Viver, errar, triunfar, criar vida a partir da vida”. Esta frase de James Joyce está literalmente inserida no código genético de uma pequena célula chamada Mycoplasma mycoides JCVI-syn 1.0, o primeiro organismo que vive com um DNA completamente montado em laboratório. E não foi por acaso.

O feito, anunciado na quinta-feira (20), aconteceu graças a um trabalho de 15 anos, 40 milhões de dólares e uma equipe de 20 pessoas, capitaneada por Craig Venter, o responsável pelo seqüenciamento do genoma humano, há dez anos. Embora seja tentador rotulá-lo como a criação de vida artificial, ainda não é o caso: o DNA, embora montado em laboratório, é o de uma espécie, Mycoplasma mycoides, e foi inserido em outra espécie, a Mycoplasma capricolum. É como se, em vez de pegar um livro de instruções já existente, a equipe de Venter redigitou todos seus capítulos, colocando umas alterações aqui e ali (como o trecho de Joyce acima e um endereço de website) para diferenciá-lo do DNA natural da célula.

Daí veio a novidade: depois de algum tempo, as células de M. capricolum começaram a ler as novas instruções, e iniciaram a produção das proteínas da M. mycoides, se comportando e aparentando ser a própria. Para todos os efeitos, ela tinha se transformado em uma Mycoplasma mycoides.

A vida que veio do computador: como os cientistas criaram a célula sintética

Foto: Arte/iG


A analogia com computadores, que Venter usou em uma coletiva de imprensa, também é válida: o “sistema operacional” de fábrica da bactéria foi trocado por outro, criado em laboratório, e ela começou a se comportar como o novo software mandava. Ainda assim, é vida a partir da vida, e não vida a partir do zero.
Aplicações e implicações
Venter acredita que este avanço tenha aplicações práticas bem interessantes. “É um conjunto de ferramentas bastante poderoso: podemos produzir vacinas de forma bem mais rápida do que atualmente, e criar algas unicelulares que podem capturar dióxido de carbono e transformá-lo em combustível, como diesel e gasolina,” afirmou durante a coletiva. Contou já ter acordos com Novartis e Exxon Mobil para ambas as pesquisas.

As implicações éticas também estão ali. Embora Venter tenha submetido todo o trabalho a comissões de bioética, o estudo com certeza faz repensar na definição de vida. “Temos uma oportunidade inédita para pensar na origem da vida, e ver como um genoma realmente funciona,” escreveu em artigo na Nature Mark Bedau, professor de filosofia do Reed College, nos Estados Unidos. Steen Rasmussen, da Universidade do Sul da Dinamarca, escreveu na mesma revista: “... construir vida usando materiais e designs diferentes vai nos ensinar mais sobre sua natureza do que reproduzir formas de vida tais quais como as conhecemos”. O primeiro passo está dado.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

O que é sinestesia?


Tiago Cordeiro; Lauro Henriques Jr.

É um distúrbio neurológico que faz com que o estímulo de um sentido cause reações em outro, criando uma salada sensorial entre visão, olfato, audição, paladar e tato. Por exemplo, para um sinesteta, o número 5 pode ser sempre verde, a segunda-feira ter gosto adocicado e um solo de guitarra produzir imagens de bolhas fosforescentes! A maioria das pessoas recebe os estímulos externos e os processa em paralelo no cérebro: um objeto visto segue uma rota específica até o córtex visual; os sons fazem seu próprio caminho até chegar ao córtex auditivo; e assim por diante. Porém, no cérebro dos sinestetas, essas trilhas se cruzam, gerando a maior mistureba no processamento da informação (veja ao lado). "Esse é um processo cerebral involuntário", diz a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Já foram catalogados 61 tipos de sinestesia, mas as causas ainda são desconhecidas. Sabe-se apenas que a genética tem influência. "A sinestesia é comum em algumas famílias e está relacionada a pelo menos três cromossomos", diz a psicóloga britânica Julia Simner, da Universidade de Edimburgo, na Escócia. Essa confusão entre os sentidos também pode rolar por outros motivos, como nas alucinações pelo uso de drogas. Mas, nesses casos, a mistureba é aleatória, enquanto que, para um sinesteta, um nome roxo sempre será roxo.

Caminhos cruzados
Acompanhe as rotas de entrega de nosso motoboy cabeção e confira como rola a mistureba sensorial no cérebro de um sinesteta

Emoções cheirosas

O cruzamento entre os receptores olfativos do sistema nervoso central e o sistema límbico, que regula as emoções, faz com que, por exemplo, o cheiro de rosas deixe o sinesteta irritado ou vice-versa, que uma pessoa irritada sinta cheiro de rosas

Sabores com temperatura

Não se trata de comida quente ou fria, mas de duas sensações diferentes se misturando no sistema nervoso central. E aí o gosto de vinho pode provocar a mesma sensação de frio que uma ventania, por exemplo

Cheiros barulhentos

Por causa da confusão entre o córtex auditivo e os receptores olfativos, um perfume pode fazer a pessoa literalmente ouvir coisas. Pior ainda no caso dos cheiros ruins: além de ter que aguentar o fedor, a pessoa ouve uma barulheira junto...

Sons coloridos

Em vez de ir direto ao córtex auditivo, os ruídos dão uma passada pelo córtex visual. Resultado: uma nota musical fica parecendo uma bola colorida

Nomes com personalidade

Outro tipo recorrente. A combinação das letras ou dos sons que formam um determinado nome interfere no sistema límbico. A pessoa passa a achar que todo José é confiável, ou que as sextas-feiras são deprimentes

Números e letras com cor

É um dos tipos mais comuns de sinestesia. Rola dentro do córtex visual: no lugar de processar apenas o sinal escrito, com a cor com que ele foi impresso, o cérebro o relaciona com outras cores específicas

Sentidos criativos
Conheça a galeria dos sinestetas mais famosos do mundo

Richard Feynman (1918-1988)

O físico americano, ganhador do Nobel de 1965, dizia ver letras e números coloridos. Enquanto dava aulas, ele via letras xis marrom-escuras flutuando no ar

Wassily Kandinsky (1866-1944)

Tudo indica que o pintor russo misturava quatro sentidos: visão, audição, olfato e tato. Ele chegava até a cantar os tons de cores que pretendia usar na paleta

Eddie van Halen (1955-)

O guitarrista americano, fundador da banda Van Halen, usou o dom de ver notas musicais coloridas para criar a "nota marrom", usada em discos da banda

Vladimir Nabokov (1899-1977)

Quando criança, o autor russo reclamava que as cores de seu alfabeto de madeira estavam erradas. Criou vários personagens sinestetas
Revista Mundo Estranho

O que é uma célula sintética?


Bruno Lazaretti
É uma célula cujo DNA foi removido e substituído por outro, criado em laboratório. Em outras palavras, é uma célula programada. O DNA é uma cadeia formada por quatro tipos de moléculas, chamadas nucleotídeos, agrupadas em conjuntos chamados genes. Como a sequência desses genes determina as funções biológicas da célula (produção de proteínas, respiração e locomoção), os cientistas podem controlar uma célula adicionando e removendo genes específicos de cada ação. Pra que isso serve? Os usos vão de medicina a controle do aquecimento global!

Frankenstein Microscópico
Como são criadas as células sintéticas de bactéria, as únicas viáveis até agora
1. Uma célula bacteriana, existente na natureza, é selecionada e isolada. A primeira célula sintética capaz de se reproduzir, criada por cientistas do J. Craig Venter Institute, é a da Mycoplasma capricolum. Ela foi escolhida por ter um genoma pequeno: cerca de 1 milhão de nucleotídeos
2. A sequência de genes do DNA da bactéria é fragmentada, digitalizada e vira um monte de letras na tela de computador. Os cientistas reescrevem o DNA, incluindo novas informações. É aqui que escolhem quais funções biológicas entram e quais saem

3. Com esse código digital criado no computador, a célula sintética é transformada em um genoma de verdade. Nesse processo, os pesquisadores constroem blocos de DNA utilizando bases químicas: A (adenina), T (timina), G (guanina) e C (citosina) - também presentes no DNA natural

4. Os blocos montados artificialmente são inseridos em leveduras (fungos), que possuem enzimas de correção de DNA capazes de emendar pedacinho por pedacinho da sequência de letras, formando fragmentos grandes. E eles se juntam e se combinam até formarem um DNA novo, com 1 milhão de letras

5. O genoma remontado é transplantado para outra célula, parecida com a anterior. Se as células receptoras aceitarem o novo DNA implantado, elas se transformam em uma nova espécie e se multiplicam normalmente. Além disso, seguem as características definidas pelo DNA artificial

Mil e uma utilidades
A programação de bactérias abre um leque de oportunidades para as inovações científicas
Captura de Carbono
As células de algas consomem dióxido de carbono e os transformam em oxigênio. Criar um DNA que permita uma rápida reprodução, retirando as características maléficas de suas funções biológicas (como infecção de outros organismos) daria origem a uma bactéria que combate o aquecimento global!

Produção de combustível

Como as células de algas microscópicas realizam fotossíntese e produzem açúcar, elas podem substituir a cana-de-açúcar como fonte de álcool combustível. A vantagem é que o cultivo dessas algas ocupa muito menos espaço do que o cultivo da cana - o que libera terras para outras plantações, de alimentos e de madeira

Bioterrorismo

Ok, esta não é legal. Criar superbactérias que sobrevivem em vários ambientes, com alta taxa de infecção em organismos humanos e eficientemente letais é teoricamente possível - e assustador. Na mão de exércitos ou terroristas, bactérias sintéticas podem se tornar armas terrivelmente funcionais

Produção de remédios

As células programadas poderiam produzir proteínas e substâncias que compõem remédios. Basta controlar a taxa de reprodução celular com pequenos ajustes no DNA e, voilà, fábricas de remédios microscópicas!

Glossário

DNA
é uma molécula que fica dentro das células e contém várias informações genéticas
Gene é a parte funcional do DNA, que carrega toda a informação genética passada por gerações

Genoma é um conjunto completo de material genético (genes), encontrado no núcleo das células. Mantém os aspectos relacionados à descendência

Consultoria Luisa Hugert, bacharel em ciências moleculares pela USP
Revista Mundo Estramho