quarta-feira, 9 de março de 2011

O xadrez do hidrogênio


É preciso pensar estrategicamente para adaptar o Brasil ao combustível do futuro
por Ennio Peres da Silva
Questões ambientais globais, instabilidades internacionais no fornecimento e elevação dos preços do petróleo com a conseqüente busca pela segurança no suprimento de energia são fatores que têm levado muitos países a buscar alternativas energéticas, entre elas o uso do hidrogênio, principalmente em células a combustível.
Uma característica fundamental dessa tecnologia é a necessidade de integração de diversas áreas do conhecimento, envolvendo cada uma das etapas da cadeia do hidrogênio: geração, processamento/armazenamento/transporte/distribuição, conversão, aplicações, além de ações transversais como análise de mercado, segurança, normatização e educação para esta nova tecnologia.

O Brasil participa desse esforço através de suas instituições de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), empresas e órgãos governamentais da área energética e tecnológica. A busca por uma ação nacional integrada teve início em 2000, com reuniões organizadas pela Finep, Financiadora de Estudos e Projetos. No final de 2002 foi lançado o Programa Brasileiro Sistema de Células a Combustível – ProCaC, pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, cujo objetivo principal é orientar as atividades de P&D em células a combustível e tecnologias associadas, a fim de otimizar a utilização dos recursos disponibilizados pelas agências financiadoras oficiais. Suas primeiras ações foram implementadas em 2004. Entre essas ações está a formação das redes de P&D que devem começar a atuar organizadamente em 2005.

No âmbito da política energética para o hidrogênio, o governo brasileiro, através da Ministra de Minas e Energia (MME), Dilma Roussef, assinou em 2003 um convênio de cooperação com os EUA, sendo convidado a participar da IPHE (International Partnership for the Hydrogen Economy), parceria internacional entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, destinado a alavancar o uso energético do hidrogênio em todo mundo.

No momento, o MME elabora o Roteiro da Política Brasileira para Estruturação da Economia do Hidrogênio, com a participação de várias entidades nacionais envolvidas com essa tecnologia. Como diretrizes gerais, o MME já definiu que o uso energético do hidrogênio será tratado na matriz energética brasileira como um vetor, favorecendo prioritariamente o uso das fontes renováveis de energia, como o álcool de cana. Num futuro em que boa parte dos automóveis estiver equipada com eficientes células a combustível, será mais compensador usar o etanol para produzir hidrogênio do que para mover carros com motor a álcool.


Antes, porém, a produção de hidrogênio como combustível poderá ser feita a partir do gás natural, do qual o país conta com reservas significativas recém-descobertas na Bacia de Santos. Estrategicamente, esse energético pode favorecer a transição para o uso intensivo do hidrogênio, devido ao menor custo envolvido na geração deste elemento a partir do gás natural.

É interessante notar que desde 2000, enquanto a política para o hidrogênio está sendo definida, os grupos de P&D e algumas empresas de base tecnológica que trabalham nas diversas áreas envolvidas vêm direcionando suas atividades para ramos mais ou menos complementares entre si, estabelecendo-se competências com pouca sobreposição. Sem dúvida que este “ordenamento natural” foi fruto das inúmeras reuniões e encontros promovidos entre esses grupos, com ou sem a participação governamental. Assim, enquanto programas governamentais de envergadura são estruturados, como aconteceu com o biodiesel, os grupos utilizam os recursos que têm à disposição para progredirem tecnologicamente, sem perder contato com os avanços internacionais naquele que está sendo preparado para ser o combustível do século XXI.

Ennio Peres da Silva É coordenador do Laboratório de Hidrogênio(LH2) e do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Universidade de Campinas (UNICAMP)
Scientific American Brasil

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